Estão próximos de mim, discutem sobre a próxima dose, mas eu não entendo. O primeiro escora o chão o segundo sustenta o pé em riste, escuro e mal lavado, apontado para sua face. Dialogam ações sem sentido. Estou me perguntando se meu trajeto é o correto: ferro na mão, borrachinhas e a luminária com uma lâmpada nova na outra. O celular só tem um ponto de bateria. Passo pelos personagens, eu arrebito o nariz ao mesmo tempo em que olho para os próprios sapatos monologando: “sapatilhas turquesa e vestido verde bandeira não é de bom anúncio...”. Adiante há uma loja de plástico pergunto ao rapaz que toma conta da cena às minhas costas: “O senhor vende espuma?” Antes da resposta três cegos me atropelam, sou lançada em meio aos metros de plástico colorido. Eles seguem e interrompem o diálogo dos bêbados no mesmo instante em que o sapato de um salta do pé e lança as moedas ao chão “compra mais uma cana pra mim, meu!”. O vendedor ri da minha queda, gargalha com o bêbado e eu assisto o trio de cegos seguindo o percurso com segurança. Os bêbados se despeçam.
Não estou no trajeto correto. Retorno ao meio do caminho e encontro minha espuma. A cena dos bêbados-cegos não me sai da mente. “Estou procurando um turíbulo, não posso esquecer”, me desvio. Lembrei, de leve, que também estou indigente, contando com os trocados do bolso e rezando para encontrar a carteira quando voltar a casa. A responsabilidade da autonomia rege-se pela resposta aos objetos, se você não sabe deles ninguém mais pode responder por eles.
Vou à casa de ervas que me tratou sempre muito bem, pego meu turíbulo novo e uns tabletes de defumador. Tenho por responsabilidade nova a expurgação e manutenção da luminosidade espiritual do lar. Antes guardava as ações apenas para meu quarto, agora a gerência amplia e testa meu conhecer.
São sete sacolas e poucos reais para o almoço. O restaurante natureba do período da faculdade fechou e não sei mais o que fazer. Compro um salgado e corro para as provas: devo responder por elas antes que me devorem devagar.
Recebo durante a tarde e revelações são tomadas ao meu dia. A vida tem cura para si mesma. Os bêbados resolvem seus próprios vícios e eu avalio a própria trama. Tem uma celebração nos próximos dias para nos saldar. Devo dispersar o rancor e deixar o coração chorar. Ele se lava. Abri os olhos de manhã e pensei logo: seguir o fluxo da vida, trazer vitória aos pequenos acontecimentos. Portanto é bom dizer: cheguei a casa, cumpri a sina, recebi e doei abraço. É tudo muito importante.
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